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Manta líquida: Realidade ou fantasia? Entenda a verdade inconveniente desta solução “milagrosa”

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Há alguns anos vemos chamadas comerciais para inúmeros e diferentes produtos de impermeabilização com o nome de “manta líquida”.

É complicado explicar, de forma simples, que não existe solução mágica de impermeabilização para tudo. As promessas de resolver desde unha encravada até infarto do miocárdio estão em muitos apelos de venda, ainda mais quando não mostram que seguem as normas técnicas que devem disciplinar o uso dos produtos.

Vamos ao básico, que é checar a definição que existe à nossa disposição, sobre este nome. No dicionário Aurélio ou no site Wikipédia, não existe o termo “manta líquida”, mas temos para “manta”:

Cobertor, coberta, colcha, pano que se põe por baixo do selim, manta de retalhos, manta de toucinho, entre outras…

Pois é, então vamos onde existe esta definição em relação à impermeabilização, que é na norma ABNT NBR 9575 (e tem gente não gosta das normas!). Esta é a definição de “Manta para Impermeabilização”:

produto impermeável, pré-fabricado, obtido por processos industriais, tais como calandragem ou extensão

Explicando: Manta para impermeabilização é um produto que passa por um processo de pré-fabricação, ou seja, não é líquida.

Certamente quem fabrica ou presta serviços na área de impermeabilização não se pode dar o conforto de desconhecer as definições da norma ABNT NBR 9575.

Será que temos um conflito de interesses entre usar de tudo para vender com a realidade dos fatos? Será que nas embalagens dos produtos existem os dados e informações técnicas que amparem o consumidor para que ele, como leigo no assunto impermeabilização, não compre gato por lebre?

Solução mágica

Eu pensei e conversei com várias pessoas para entender o porque do uso deste termo “manta líquida” para um produto que não é pré-fabricado e cheguei à seguinte conclusão: As mantas pré-fabricadas transmitem uma segurança a quem compra, pelo princípio de que elas passam por controles de qualidade que comprovam o atendimento das normas técnicas e que fez deste produto, entre eles a manta asfáltica, ser uma referência para obras novas e em reformas, nos mais diversos tipos de construção.

Entretanto, esta tecnologia vêm sempre com o apelo (negativo, no caso) de que é necessária uma mão de obra treinada para aplicação, já que precisa ser colada ao substrato com uso de asfalto a quente ou com auxílio de maçarico a gás (GLP).

Bingo! Temos um produto líquido com o apelo positivo de que não é necessária uma mão de obra especializada e de vai resolver o meu problema custando pouco ou quase nada, pois qualquer pessoa pode fazer sua aplicação! Para que vou me preocupar com o que está ou não escrito nas embalagens?!

Acho que deve se preocupar sim. Gaste um tempinho para ler, com paciência, o que está nas embalagens dos produtos, pois vai encontrar muitos termos superlativos como “excelente cobertura”, “alto poder de alongamento”, “alta resistência as intempéries”, “secagem ultrarrápida e sem emendas”, que tem “elevada estanqueidade à água”…

Tudo muito bonito, mas não temos parâmetros para os termos usados! Onde estão os resultados que comprovem através de testes os desempenhos alegados?

Em alguns casos vamos encontrar a citação de que a “manta líquida” atende a norma ABNT NBR 13321, que é para membranas acrílicas, o que nos chama para a referência à seguinte definição na mesma norma já citada, a ABNT NBR 9575, de “membrana para impermeabilização”

“Camada de impermeabilização moldada no local com características de flexibilidade e com espessura compatível para suportar  as movimentações do substrato, podendo ser estruturada ou não”.

 

Eureka! Toda “manta líquida” é uma membrana para impermeabilização! Ou, ao menos, deveria ser…

 

Atende ou não atende?

Para facilitar o entendimento de todos, vamos focar nos produtos de base acrílica que devem atender a ABNT NBR 13321, onde estão as exigências quanto ao desempenho (com uso ou não de reforço/estruturante), bem como as condições de aplicação.

Para deixar mais claro, segue o que é previsto para este tipo de impermeabilização, logo na primeira página da Norma:

1 Escopo da ABNT NBR 13321

1.1 Esta Norma fixa as condições mínimas exigíveis para membrana acrílica monocomponente à base de polímeros acrílicos termoplásticos em dispersão aquosa, destinada a impermeabilizar as superfícies que devem ficar expostas às intempéries, sobre as quais é limitado o trânsito para manutenção eventual.

1.2 Esta Norma não se aplica à utilização de membrana acrílica em lajes com proteção mecânica ou em qualquer tipo de piso de acabamento, bem como em lajes sujeitas ao trânsito de pessoas ou veículos de qualquer natureza.

Entre o que a ABNT NBR 13321 exige como requisitos de desempenho mínimo para membrana acrílica sem armadura e aquilo que os fabricantes declaram em seus informativos ou boletins técnicos, temos uma enorme distância. Para este fim, apresento uma tabela comparativa com apenas quatro produtos que se encontra facilmente em lojas de varejo da construção civil.

Não é discriminação, mas pesquisando na Internet, encontrei mais de 10 produtos com o apelo comercial de “manta líquida”, e ainda por cima que podem ser feitos com diferentes matérias primas, entre elas, asfálticas, poliuretano, resinas sintéticas. Existem em diversas cores, que aceitam o assentamento direto de revestimento sobre a mesma, que podem ser aplicadas em áreas molhadas, em lajes expostas ou não, que tem elevada estanqueidade à água. Ufa!

Tabela comparativa de desempenho de acordo com a ABNT NBR 13321, sem uso de estruturante, para produtos de base acrílica.

Requisitos da ABNT NBR 13321 Unidade Parâmetros Produto A Produto B Produto C Produto D
Resistência à tração na ruptura- mínimo MPa 1,5 Vide obs.* Nada informa se atende a norma Nada informa se atende a norma Nada informa se atende a norma
Alongamento na ruptura-mínimo % 100 Vide obs.* Idem acima Idem acima Idem acima
Absorção de água-máximo % 15 Vide obs.* Idem acima Idem acima Idem acima
Envelhecimento por intemperismo artificial Sem alterações Vide obs.* Idem acima Idem acima Idem acima
Alongamento na ruptura após envelhecimento-mínimo % 100 Vide obs.* Idem acima Idem acima Idem acima
Flexibilidade a baixa temperatura após o envelhecimento (5°C) °C Sem fissuras Vide obs.* Idem acima Idem acima Idem acima

Obs.* O fabricante A, já comete um equívoco em citar a ABNT NBR 13321, pois esta norma não reconhece o termo “manta líquida” e também não mostra os resultados de desempenho do seu produto.

E agora?

Basta de se jogar dinheiro e tempo fora só porque se parte da premissa de quem compra deve saber o que está fazendo. Será?

Enfim, o que queremos é explicar e não confundir. Para isto acontecer é necessário que as informações ou indicações para aplicação de um tipo de impermeabilização sejam claras e objetivas. E só temos uma maneira, que é disciplinar esta atividade, criando ou revisando normas técnicas.

Uma oferta legítima de soluções de impermeabilização é pertinente para todas as necessidades. Afinal não é o tamanho da área impermeabilizada e sim a importância da garantia de estanqueidade, desde um pequeno local em uma residência modesta até a mais sofisticada cobertura. Todos querem a mesma coisa. Sossego e certeza de que não será incomodado com as consequências, sempre danosas, da presença ou passagem de água pela sua construção.

Como a intenção desta série de artigos é de ser interativa, seguem as minhas propostas à discussão do tema, para as quais conto com seus comentários.

  • Você já usou as chamadas “mantas líquidas”?
  • Como foi sua experiência?
  • O que você acha deste tipo de impermeabilização?
  • Você compraria sem ter exemplos conhecidos de aplicação?
  • Você lê todas as informações das embalagens antes de comprar um produto deste tipo?

Normas citadas.

ABNT NBR 9575:2010 – Impermeabilização – Seleção e projeto. Confirmada em 16.06.2015

ABNT NBR 13321:2008 – Membrana acrílica para impermeabilização

Eng. Civil MSc Marcos Storte, Diretor técnico da A2S Engenharia e Perícias

[email protected] –  www.a2s.consultoria.com.br

 

 

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Professor na pós-graduação lato-sensu, nos cursos de patologia nas obras civis e de patologia na Impermeabilização, desde 2006, em diversas cidades do Brasil. Autor do livro "Látex Estireno Butadieno - Aplicação em Concretos de Cimento e Polímeros" Atuante desde 1978, com o conhecimento construído em atividades técnicas na criação, desenvolvimento e normalização de produtos ao mercado e de gestão em consultoria na área de tecnologia de impermeabilização de edificações residenciais, comerciais, industriais e de saneamento, proteção às estruturas de concreto e atenuação ao ruído de impacto entre lajes, elaborando projetos, procedimentos executivos, treinamentos “in company”, fiscalização de obras, objetivando dirimir dúvidas e possibilitando a implantação dos conteúdos dos projetos e normalizações, sempre com o alto padrão de excelência. Palestrante com mais de 60 trabalhos apresentados em congressos nacionais e internacionais com inúmeros artigos técnicos e matérias publicadas sobre proteção às estruturas, impermeabilização e isolação acústica, bem como atuante em comissões de estudo da ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas, CB 2 - Construção Civil; CB 22 – Impermeabilização e CB 90 – Qualificação de pessoas. Diretor Técnico da A2S Engenharia e perícia.

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